Na esteira do repúdio generalizado desta semana a
partidos políticos intervencionistas e socialistas no Brasil - e a um repentino
surto de amplo apoio a candidatos favoráveis ao mercado - recebi muitas
perguntas: Como o Brasil fez isso? Como vocês têm tantos libertários? Como
vocês conseguiram fazer tudo isso? Como vocês elegeram essas pessoas? Como isso
aconteceu?
Essas perguntas são feitas a mim e a outros
libertários brasileiros por todos os libertários não brasileiros que eu
conheço.
Se você não está ciente do crescimento do movimento
libertário no Brasil, então considere visitar um de nossos eventos. Nada supera
esta experiência. Mais e mais, eles atraem centenas de pessoas, com muitos,
inclusive, cobrando um preço não muito amigável. Precisamos fazer isso porque
só podemos acomodar tantas pessoas se pudermos pagar por locais que tenham essa
capacidade.
Você pode também ir a escolas ou universidades e ver
alunos lendo e citando Mises, Rothbard e Hoppe, encarando professores de
esquerda que pregam o evangelho do estado e organizando grupos de estudantes.
Eu criei um site onde você pode cadastrar-se como um libertário, iniciando um
grupo de orientação libertária, o que permite que cada pessoa registrada em um
raio de 50 km receba uma notificação por e-mail. Com pouco esforço e promoção, nós
temos agora mais de 200 grupos registrados, a maioria deles em escolas ou
universidades.
Você também pode fazer o oposto: ir a reuniões de
esquerda e perguntar o que eles desprezam, com o que estão preocupados. Além do
surgimento de uma nova direita e seu padrão socialista médio, você ouvirá sobre
os “ultraliberais”, ouvirá lamentações sobre como as pessoas não aderem mais à
opinião admissível, ousando desafiar os dogmas estatistas através da utilização
de coisas simples como a internet e de autores “neoliberais” como Mises, os
quais argumentam a favor do livre mercado, da desregulamentação e até do fim do
estado.
Entretanto, um dos exemplos mais intrigantes que eu
posso aqui expor trata de um vereador de uma cidade de cinquenta mil habitantes
no sul do Brasil. Ele foi eleito quase sem querer, tentando apenas para apoiar o
seu partido. Depois de ser empossado, começou a investigar a administração
pública e a economia. Descobriu o Instituto Mises Brasil, o meu canal, leu
alguns livros e, pouco mais de um ano depois, finalmente percebeu que aquilo o
que a Câmara municipal fazia era simples perda de tempo e dinheiro.
Muito também pode ser visto sem ter que embarcar num
avião para o Brasil. Um rápido passeio pelos livros mais vendidos na Amazon
Brasil provavelmente causará surpresa a muitos. Lá temos, por exemplo, “As seis
lições”, de Mises, em terceiro lugar no segmento economia, “A mentalidade
anticapitalista” em sexto e “O livre mercado e seus inimigos” em décimo
primeiro. O livro sobre Bitcoin, de Fernando Ulrich, está no décimo quarto lugar,
“O que o governo faz com o nosso dinheiro”, de Rothbard, em décimo-quinto, “Ação
humana” em décimo sétimo e “O que deve ser feito”, de Hoppe, em décimo nono.
Vinte e dois dos cinquenta livros mais vendidos estão relacionados à economia
de livre mercado, com alguns de Adam Smith no meio deles.
Seis dos cinquenta livros mais vendidos no segmento
política também têm um toque de liberdade, sendo um deles “Democracia, o deus
que fracassou”, de Hoppe, em quadragésimo primeiro. E ainda assim, suspeito que
isso esteja distorcido para baixo, já que devido à eleição qualquer livro que traga
temas como "fascismo" no título tenha vendido bem, uma vez que a
esquerda fez uma enorme tempestade em torno dessa questão.
Outro número interessante é o do meu canal no YouTube
sobre o libertarianismo. Ele tem cerca de meio milhão de assinantes, 76 milhões
de visualizações e está crescendo.
O fato é que as pessoas estão mudando suas mentes.
As estatísticas parecem apoiar isso. Um estudo feito
em março deste ano tentou mostrar que a maioria dos brasileiros ainda apoia um
estado grande. Isso por si só já é uma prova de que o libertarianismo está
crescendo: as pessoas se sentiram compelidas a tentar encontrar dados para
dizer o contrário, elas se sentiram ameaçadas e precisavam de novas garantias
quanto a isso.
De qualquer forma, o estudo saiu pela culatra de uma maneira
que poucas pessoas perceberam: 3,6% das pessoas declararam que o estado deveria
estar completamente fora do fornecimento de bem-estar social, educação, saúde,
cuidados de idosos e aposentadorias e desigualdade de renda. Eles disseram que
o estado não deveria se meter nas relações entre os sexos e os grupos
minoritários. Somando a isso, 10,5%, ou 22 milhões de pessoas, eram a favor da liberdade
total para os mercados.
Uma
breve história do Movimento Libertário Brasileiro
O que também é impressionante é o quão rápido chegamos
até aqui. Há apenas quatro anos, seria insano dizer que isso aconteceria no
Brasil. A candidata de extrema-esquerda e presidente, Dilma Rousseff, acabara
de ser reeleita, apesar de sua incompetência dolorosamente óbvia e de um grande
escândalo de corrupção. Nenhum partido de oposição existia, e seu governo
tomaria claramente uma linha dura em favor de uma multiplicidade de políticas
intervencionistas pró-impostos e pró-regulação, juntamente com gastos
governamentais aparentemente intermináveis.
Tudo estava perdido, pareceu-nos. Muitos amantes da
liberdade planejavam sua fuga do país, e o caminho para a Venezuela não passava
de uma inevitabilidade estatística.
Não mais do que cinco ou seis anos atrás, um evento
relacionado à liberdade dificilmente atrairia mais de cinquenta pessoas nas
grandes cidades, e antes disso, as pessoas que defendiam o libertarianismo tinham
boas razões para se preocupar com a perseguição política, já que o governo de
esquerda parecia invencível. No entanto, tudo isso foi derrotado na eleição que
ocorreu esta semana.
Mas quem são esses novos candidatos que venceram,
substituindo o antigo regime?
Apenas alguns candidatos aderiram a uma consistente
plataforma libertária. Muitos aderiram em grande parte aos pontos econômicos,
embora sejam claramente não-libertários em questões como a descriminalização de
drogas, adoção por casais homossexuais ou homeschooling – o qual é ilegal no
Brasil. No entanto, a discussão geral tem se voltado para muito menos
interferência estatal na economia, equilibrando o orçamento, além da defesa de
um modelo de privatização radical e de forte desregulamentação.
Um dos feitos mais impressionantes foi conseguido por
Romeu Zema, um empresário de muito sucesso e um daqueles que chamo de
“libertários que não sabem que são libertários”, os quais decidiram concorrer
ao governo de Minas Gerais sob o partido Novo. Ele e o partido ostentaram a
plataforma mais livre mercado nesta eleição, obtendo 72% dos votos nos segundo
turnos. O Novo também elegeu 8 nomes para a Câmara dos Deputados, um dos quais
eu apoiei como um libertário “completo”, além de doze representantes em nível
estadual, quatro dos quais eu apoiei. Acrescente-se a isso Bruno Souza, um
libertário de boa-fé eleito por um outro partido para a legislação estadual de
Santa Catarina, além de um senador eleito pelo Livres, um grupo liberal no sentido
original da palavra e ligado a muitos partidos diferentes, e nós temos uma demonstração
impressionante nestas que foram as primeiras eleições federais onde os
libertários concorreram.
Além de tudo isso, há muitos candidatos em ambas as
câmaras federais e legislaturas estaduais que concorreram em uma linha
claramente mais livre mercado do que jamais poderia se imaginar. Muitos deles
podem estar apenas mentindo, mas mesmo isso seria uma espécie de vitória. Se os
políticos estão defendendo o livre mercado por mera conveniência eleitoral,
isso significa que as ideias estão se espalhando e eles não podem fazer nada
além de se render à onda.
Porém, muitos deles são provavelmente sinceros, apesar
de contraditórios em alguns pontos, o que você esperaria de pessoas que são ainda
novas no movimento. Muitos partidos elegeram representantes que realmente acordaram
e perceberam que o socialismo e a intromissão do Estado são fardos, que as
pessoas são melhores livres. Quantos? É interessante dizer que simplesmente não
temos certeza sobre quantos assim realmente existem. Apenas as votações deles
realmente nos dirão.
Finalmente, temos o caso do presidente eleito, Jair
Bolsonaro. É difícil encontrar um artigo em inglês sobre ele que não repita
simplesmente as manchas e distorções que a mídia brasileira lhe deu. Não ajuda
muito o fato de que somente no ano passado ele tenha aprendido a não fazer
declarações confusas e obscuras que podem ser facilmente distorcidas por seus
oponentes.
A crítica apropriada a ele deve estar centrada em
inconsistências, falhas e erros. Retratá-lo como uma ameaça autoritária, na
melhor das hipóteses, é enganoso. Embora tenha feito declarações que podem ser
interpretadas como autoritárias, ele não é nada mais do que o brasileiro comum.
Certamente não é uma ameaça maior do que qualquer coisa que os esquerdistas
tenham feito nos últimos trinta anos. Seu primeiro discurso após a vitória
contou com uma mesa com quatro livros: a Constituição, a Bíblia, uma biografia
de Churchill e um livro de Olavo de Carvalho, um famoso filósofo conservador
brasileiro.
Entretanto, ele não é libertário. Se alguém tivesse que
colocar uma definição para ele, seria de um conservador amigo do mercado, mas
não fique preso em rótulos. Uma notável bandeira vermelha é a sua completa
oposição à descriminalização das drogas e um plano de educação
consideravelmente centralizador. Suas propostas econômicas são de longe as mais
livre mercado a ganhar uma eleição no Brasil, com ele fazendo extensas e amplas
declarações em favor da defesa da propriedade privada, apesar de algumas falhas
nos detalhes. Ele ainda defende um Banco Central, não se opôs ao imposto de renda
e reluta em privatizar empresas que considera "estratégicas", o que
quer que isso signifique. Embora haja economistas de inclinação austríaca à sua
volta, a maioria deles é monetarista, com tudo o que isso implica. Paulo
Guedes, seu economista-chefe, é um conhecido amante do livre mercado da Escola
de Chicago e pode-se esperar que isso signifique muito mais coisas boas do que
ruins. Por fim, ele defende a crescente descentralização do poder, que é muito bem-vindo.
No entanto, só saberemos verdadeiramente o quanto isso
é real quando ele realmente estiver empossado. O Brasil precisa urgentemente de
profundas reformas. Depois de três mandatos presidenciais do Partido dos
Trabalhadores, há muito a ser feito. Muitas das medidas necessárias serão
profundamente impopulares, fáceis de serem distorcidas pela esquerda e bastante
complicadas. O discurso e a promessa estão feitos, agora é a hora de agir e ver
o que acontece. Ainda assim, se ele conseguir fazer um terço do que planejou,
teremos muito mais liberdade do que poderíamos imaginar alguns anos atrás.
Além disso, nossas esperanças não devem estar focadas
no que alcançamos até agora, mas no fato de que estamos apenas no começo de
algo bem mais profundo. O libertarianismo está em ascensão, levando pessoas de
todas as posições políticas a perceber que é ético e melhor deixar as pessoas conduzirem
suas vidas em paz. A longo prazo, não é essa ou aquela eleição o que de fato importa,
mas a tendência, o caminho intelectual que está sendo tomado pelas mentes das
pessoas. E esse caminho está indo em direção à liberdade.
Organizações pró-mercado estão surgindo em todo o
lugar, novos livros estão sendo traduzidos e escritos, estudantes estão se
organizando cada vez mais. Os empreendedores do país estão percebendo que o
protecionismo, os subsídios e as taxas de juros artificialmente reduzidas são
forças de destruição. As pessoas estão percebendo que a regulamentação dos
negócios, os impostos e burocracia, tudo isso prejudica os pobres de forma
desproporcional, impedindo-os de dar seus primeiros passos. Além disso, as
reformas e os espaços que nos permitirão respirar liberdade, os quais serão
abertos por eles, criarão um terreno fértil para a liberdade mostrar na prática
o que ela prega. Quando as pessoas experimentam seu efeito em suas vidas e veem
os bons resultados, fica difícil pensar que desistirão facilmente.
E é isso o que nos traz de volta à questão de como
chegamos até aqui. A resposta simples é que nós não temos certeza, estamos tão
estupefatos quanto todos os outros. Nós nos acostumamos a nos sentir assim o
tempo todo e continuamos espalhando a liberdade do mesmo jeito.
No entanto, alguns nomes são inevitáveis. O governo
incompetente de Dilma Rousseff, a crise econômica que ela e seu partido
provocaram, além de dois enormes escândalos de corrupção foram inegavelmente
fundamentais para esse despertar libertário. Poucas coisas ajudam tanto os
argumentos libertários como ter pessoas no governo que não passam de um bando
de ladrões em grande escala, com os serviços prestados pelo governo mostrando-se
tão claramente como um desastre irrecuperável.
Entretanto, isso por si só não produz tal coisa. Há
muitas pessoas que trouxeram as ideias de liberdade para o povo. Não podemos ignorar
Henry Maksoud, que nos anos setenta e oitenta traduzia Mises e Hayek em sua
máquina de escrever e dirigia sua revista Visão, dedicada a promover a
liberdade. Como ele não era jornalista, a lei e o sindicato dos jornalistas
afirmavam que ele não poderia ser o editor-chefe da revista, então ele pagava uma
multa todo mês e seguia em frente.
E há muitos outros, muitos para citar completamente,
que passaram a última década subindo e descendo o país fazendo palestras, dando
aulas e fomentando grupos de estudo. A maioria, senão todas, fizeram-no com perda
pessoal e financeira, em tempos em que a eterna vitória do socialismo no Brasil
era tudo uma questão de tempo, em lugares completamente hostis como
universidades dominadas pela esquerda, quase sempre reunindo um punhado de
pessoas dispostas a ouvi-los.
O Instituto Mises Brasil também foi fundamental para
esse processo. Ao traduzir dúzias de livros e divulgá-los por todo o país, publicando
artigos fortes, claros e profundos, prevendo as crises econômicas no Brasil ainda
em 2011, eles criaram uma base intelectual que mesmo a esquerda ousa apenas dar
uma olhada cuidadosa.
Outro marco foram as associações empresariais, como o
Instituto de Estudos Empresariais do Rio Grande do Sul ou os diversos institutos
de formação de líderes espalhados por todo o país. Eles trouxeram empresários
de muitos ramos diferentes, os quais passaram a aprender sobre Mises, Hayek,
liberdade, economia e política, e foram fundamentais, espalhando muitas sementes
de um movimento como este, com as nossas necessidades.
Por fim, temos a internet e todas as suas maravilhas.
Com meu canal do YouTube posso alcançar cem mil pessoas por dia. Muitos outros
canais, páginas do Facebook, contas do Twitter, blogs, etc., formam um
ecossistema de ideias que nos ajuda a levar as ideias de liberdade a todos os
cantos do país.
Se você está interessado em descobrir mais, então
venha ao Brasil e veja por si mesmo. Adoraríamos descobrir como compactá-lo e
exportá-lo para o mundo.
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